sexta-feira, 6 de março de 2020

Conselheiro Tutelar de Itaperuna tem mandato cassado


Confira na íntegra a decisão processual:

Processo nº:
0030085-22.2019.8.19.0026
Tipo do Movimento:
Decisão
Descrição:
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO ajuizou Ação Civil Pública de Impugnação do Candidato ROBSON DE ALMEIDA JÚNIOR ao cargo de Conselheiro Tutelar do Município de Itaperuna, ao argumento de que o réu infringiu o artigo 5º, inciso I, alínea ´a´ da Resolução nº 016/2019 do CMDCA de Itaperuna que regulamentou as diretrizes para a realização da campanha eleitoral pelos candidatos e seus prepostos durante o Processo de Escolha dos Conselheiros Tutelares do Município de Itaperuna do certame 2020-2023, ao passo que durante o pleito eleitoral estava filiado ao Partido Social Liberal (PSL), compondo a Executiva Municipal do PSL exercendo o cargo de Presidente do referido Partido em Itaperuna, utilizando-se do artifício de sua promoção pessoal em diversos eventos político-partidários realizados em Itaperuna com o fito primordial e intencional de reunir o maior número de pessoas possíveis com a intenção de captar votos para a sua candidatura ao Cargo de Conselheiro Tutelar. Da mesma forma utilizou-se de correligionários inscritos e filiados no Partido Político em que é Presidente em Itaperuna para fazer propaganda de cunho pessoal partidário nas mídias sociais, pedindo votos para a sua candidatura ao Cargo de Conselheiro Tutelar, ficando patente a prática de conduta vedada de captação ilícita de sufrágio. Além destas condutas, também vinculou toda a sua candidatura ao Conselho Tutelar às cores do Partido Social Liberal, isto com o claro propósito de tirar proveito político de tal vinculação, violando de forma irrefutável o artigo 5º, inciso I, alínea ´m´ da Resolução nº016/2019 do CMDCA. Acrescente-se ainda, que o réu envolveu-se em episódio em que se dirigiu ao Chefe do Executivo Estadual, de forma desrespeitosa e ofensiva, conduta incompatível com o exercício da função de Conselheiro Tutelar, descaracterizando o conceito de idoneidade moral, requisito indispensável para o exercício da referida função, previsto no ECA e na Legislação Municipal que trata do caso. Requer o Ministério Público que seja determinada, liminarmente: 1. a suspensão da posse do réu como Conselheiro Tutelar do Município de Itaperuna, no que toca ao mandato de 2020/2023, até o trânsito em julgado deste feito, bem como a sua suspensão do curso de capacitação respectivo, caso já iniciado; 2. a convocação do candidato seguinte na ordem de classificação para prosseguir nas etapas subsequentes do processo de escolha dos Conselheiros Tutelares do Município de Itaperuna relativo ao mandato de 2020/2023 (curso de capacitação e posse) e a obstação da posse do réu como Conselheiro Tutelar suplente, no caso de ausência de um dos titulares. O pedido veio instruído com os documentos de págs. 20/169. Determinada a Notificação do réu em cumprimento ao disposto no artigo 17, §7º, da Lei nº 829/92, conforme despacho de pág. 173. Notificado através do mandado de pags.180/181, o réu ofereceu Defesa nos termos da petição de págs.192/210, alegando, em síntese, que as denúncias de irregularidades no aludido pleito eleitoral já foram objeto de apuração no âmbito administrativo pela Comissão Eleitoral do Processo de Escolha do Conselho Tutelar, que em sua ação fiscalizatória não apurou nenhuma irregularidade ou prática de condutas vedadas, determinando o arquivamento do processo. Acrescenta que nunca negou a liderança do Partido Social Liberal do Município de Itaperuna, reconhecendo que as afirmativas de que realizava propagandas de sua candidatura enquanto era filiado ao PSL são verídicas, dado que continuou a realizar normalmente suas atividades partidárias, haja vista que filiou-se ao Partido muito antes de se candidatar a membro do Conselho Tutelar, afirmando, contudo, que nenhum ato de sua candidatura infringiu os ditames legais ou os princípios constitucionais da legalidade e moralidade, nunca praticando nenhuma conduta que não fosse condizente com a atuação de um possível Conselheiro Tutelar, ressaltando, ainda, que nunca realizou atos políticos partidários em conjunto com a sua candidatura para o Conselho. Afirma ainda, no que diz respeito a sua presença em manifestação ocorrida na UNIG, ocasião em que esteve presente o atual Governador do Estado, Wilson Witzel, que tal fato constitui direito à liberdade de expressão previsto na Constituição Federal, não podendo o cidadão ser impedido de exercê-lo simplesmente por ser eleito membro do Conselho Tutelar. Requer, ao final, a improcedência ante a falta de provas. O Ministério Público manifesta-se, nas págs. 251/254, no sentido de que as alegações apresentadas pelo réu em sua peça de defesa não foram capazes de elidir a pretensão ministerial, não tendo trazido qualquer fato novo que possuísse eficácia de modificar a situação ensejadora da deflagração da presente ação. Acrescenta que o réu mostrou-se inidôneo para a função de Conselheiro Tutelar, pois o ato de utilizar-se da máquina partidária que, frise, por relevante, possuía o Presidente da República como principal figura, fazendo uso, inclusive, de sua imagem em postagens na rede social, tem efetiva capacidade de alterar o rumo das eleições para Conselheiros Tutelares, mascarando e aviltando as reais intenções da população. É o relatório. Passo a analisar o pleito liminar. Verificando os requisitos autorizadores para a concessão da medida liminar, entendo que diante da documentação acostada, merece acolhimento o pedido de tutela de urgência do Ministério Público. Em sede de cognição sumária, a prova indiciária que demonstra a probabilidade do direito das alegações ministeriais encontra-se fundada nas cópias dos documentos acostados nas págs.158/161, relacionadas a publicações em mídias sociais, nas quais constata-se a vinculação do réu, tanto ao PSL fazendo campanha para filiação no Partido, quanto a campanha a função de Conselheiro Tutelar, pois se verifica a indicação do número 25, seu número de campanha no certame. O próprio réu reconhece, em sua peça de Defesa, como verídica a afirmação de que realizava propaganda para a função de Conselheiro Tutelar enquanto filiado ao PSL, ressaltando, no entanto, que não infringiu os ditames legais ou os princípios constitucionais da legalidade e moralidade, nunca praticando nenhuma conduta que não fosse condizente com a atuação de um possível Conselheiro Tutelar, pois nunca realizou atos políticos partidários em conjunto com a sua candidatura para o Conselho. Depreende-se que, apesar das afirmações do réu de que não realizou atos de companha para a função de Conselheiro de Tutelar concomitantemente com atos partidários do PSL, é possível constatar que sua imagem associada às duas situações, divulgada através da mídia social, por si só confunde o público destinatário, no caso o eleitor, que por questões ideológicas tem preferência por determinado partido, vinculando pessoas que estão filiadas ao mesmo e com destaque na mídia, como preferenciais para ocupar funções de conotação pública. Há, da mesma forma, fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. Com efeito, a demora na prestação jurisdicional poderá culminar com situação que fere os princípios constitucionais da Administração Pública bem como os princípios norteadores do Estatuto da Criança e do Adolescente. Nesse passo, insta consignar o artigo 133, I, da Lei Federal nº 8.069/90, que assevera: Art. 133. Para a candidatura a membro do Conselho Tutelar, serão exigidos os seguintes requisitos: I - reconhecida idoneidade moral; (...) Ainda na referida lei, os artigos 135, e 139, § 3º, referem-se à presunção de idoneidade moral do candidato a conselheiro e a atos proibitivos à escolha do candidato para conselheiro tutelar, in verbis: Art. 135. O exercício efetivo da função de conselheiro constituirá serviço público relevante e estabelecerá presunção de idoneidade moral. (...) Art. 139. O processo para a escolha dos membros do Conselho Tutelar será estabelecido em lei municipal e realizado sob a responsabilidade do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente, e a fiscalização do Ministério Público. O CMDCA emitiu a Resolução nº 016/2019, que regulamentou as diretrizes para a realização da campanha eleitoral pelos candidatos e seus prepostos durante o Processo de Escolha dos Conselheiros Tutelares do Município de Itaperuna do certame 2020-2023, que em seu artigo 5º, inciso I, alínea ´a´ prevê: ´São condutas vedadas aos (às) candidatos (as) e aos seus prepostos: I) no decorrer da campanha: a) constituir vinculação político partidária das candidaturas, seja através da indicação, no material de propaganda ou inserções na mídia, de legendas de partidos políticos, símbolos, slogans, nomes ou fotografias de pessoas que, direta ou indiretamente denotem vinculação´. Na mesma esteira da reconhecida idoneidade moral, o princípio constitucional da moralidade administrativa encontra-se ameaçado. O agir da Administração Pública e de seus agentes deve ter contornos de probidade, ética e transparência. A alegação de que o candidato teria participado do certame com os indícios de ilegalidade ventilados pelo Ministério Público precisa ser averiguada nos presentes autos, em instrução probatória exauriente, sob pena de serem admitidos agentes públicos que não preencham os requisitos essenciais de decoro e respeito exigidos para uma atuação legítima perante a sociedade. O réu, em sua Defesa, reconhece como verídica a afirmação de que realizava propaganda para a função de Conselheiro Tutelar enquanto filiado ao PSL, ressaltando, no entanto, que não infringiu os ditames legais ou os princípios constitucionais da legalidade e moralidade, nunca praticando nenhuma conduta que não fosse condizente com a atuação de um possível Conselheiro Tutelar, pois nunca realizou atos políticos partidários em conjunto com a sua candidatura para o Conselho. Entretanto, não ofereceu provas contrárias substanciais para afastar o pedido ministerial liminar, o qual, neste momento, deve ser deferido por preencher os requisitos legais. Saliente-se que os elementos que caracterizam a improbidade administrativa apontada na inicial serão alvo de cognição exauriente, devendo a instrução probatória ordinária esclarecer os fatos em baila à luz do contraditório e da ampla defesa, podendo esta decisão ser revista. Diante do exposto, recebo a petição inicial, ENCAMPO na íntegra os argumentos ministeriais e, com base nos princípios constitucionais da legalidade e da moralidade administrativa, DEFIRO o pedido liminar, com efeitos até o julgamento final deste processo: SUSPENDO a posse do réu, ROBSON DE ALMEIDA JÚNIOR, da função de Conselheiro Tutelar do Município de Itaperuna no que toca ao mandato de 2020/2023, ou, se já realizada a posse, suspendo seus efeitos; suspendo a participação do réu no curso de capacitação respectivo, caso ainda não concluído; proíbo o réu de ser empossado como Conselheiro Tutelar suplente, no caso de ausência de um dos titulares; DETERMINO a convocação do candidato seguinte na ordem de classificação para prosseguir nas etapas subsequentes do processo de escolha dos Conselheiros Tutelares do Município de Itaperuna relativo ao mandato de 2020/2023 (curso de capacitação e posse interina). Cite-se o réu, e intime-se desta decisão, na forma do artigo 17, § 9º, da Lei Federal 8.429/92, sendo-lhe, portanto, facultado apresentar contestação no prazo de 15 dias (prazo do rito ordinário, previsto no caput do art. 17 da Lei Federal 8.429/92) , não tendo havido preclusão com a apresentação da peça equivocadamente denominada contestação nas págs. 192/210, no momento em que deveria ter sido apresentada apenas a manifestação por escrito prevista no §7º do art. 17 da Lei Federal 8.429/92. Intime-se, com URGÊNCIA, e por oficial de justiça, o Município de Itaperuna e o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Itaperuna, através de seus representantes legais, para se manifestarem nos termos do artigo 17, § 3º, da Lei Federal nº 8429/92 e do artigo 6º, § 3º, da Lei Federal 4.717/65, no prazo de 20 dias (aplicando-se o inciso IV do §2º do art. 7º da Lei Federal 4.717/65), bem como para dar fiel e IMEDIATO cumprimento a esta decisão. Acrescente-se ao mandado dirigido ao CMDCA de Itaperuna a finalidade de apresentar cópia integral do procedimento relativo à candidatura do réu, como requerido pelo autor no item 4 de fls. 17, no prazo de 20 dias. Dê-se ciência ao MP e à Defesa.



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